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EAD em tempos de pandemia - Calma professor!



Estamos vivendo um momento incomparável em nossa história. Isolados, todos os professores da rede de ensino brasileira (e de outros países também) estão precisando reinventar a educação em tempo recorde. Estamos sendo obrigados "pelo destino" a transpôr o ensino de sala de aula para o modo EAD (quase isso) sem nem mesmo termos algo parecido para nos espelhar. Quando falamos em Educação Infantil e Ensino Fundamental I, isso fica ainda mais complicado. Bom, eu gostaria de iniciar uma discussão sobre isso aqui no blog, mesmo que seja apenas para registro pessoal meu - já que o blog está às moscas há anos. Também pretendo compartilhar o que tenho feito para implantar o EAD na alfabetização (atualmente sou professora de 2 turmas de 1º ano) e que recursos tenho utilizado.

Mas hoje a intenção é dizer a você que, assim como eu, foi jogado neste turbilhão acerca de um mês - ou para você que teve o recesso adiantado, mas fatalmente entrará nessa em breve - que VAI DAR TUDO CERTO. Quem sabe agora não pareça, e sim, tenho dias bem ruins aqui também, mas vamos conseguir.

Acho que o primeiro passo é realmente acalmar-se. Entenda que você está fazendo o seu melhor com os recursos que tem. Muna-se de conhecimento e busque recursos que auxiliem sua prática de forma eficaz, até para dar a menor margem possível para críticas - sabendo que elas fatalmente virão.

Todos estamos sofrendo consequências do confinamento forçado. Não apenas as famílias de seus alunos, mas você também. Confinados, com medo do que está por vir, precisando produzir material e trabalhando muito mais que antes. Então, acolha-se. Compreenda-se. Dê seu melhor. Mas não se exija perfeição. Não há um modelo pronto a seguir. Você e outros profissionais da área estão construindo uma espécie de ensino remoto inédita neste momento e haverão falhas. Toda metodologia passa por longos períodos de construção, e você está fazendo isso de um dia para o outro! Não há como não errar. Então, perdoe-se.

Eu sei que é muito difícil responder calmamente a muitas famílias que neste momento só conseguem focar nos próprios problemas, e muitas vezes reagem atacando o trabalho do professor. Se você é professor da rede privada certamente já precisou ouvir sobre exigências de redução de mensalidade, ou até pais de alunos exigindo que seu salário fosse cortado ou reduzido - eu precisei ler isso. Quem sabe você também esteja sendo assombrado pelo fantasma do possível desemprego pela inadimplência nas mensalidades. É muita coisa para lidar, então foque em uma coisa de cada vez. 

É preciso também entender as famílias. Muitas estão também trabalhando em casa, algumas perderam seus empregos, todas confinadas e isoladas pelo menos, e agora ainda tendo que dar conta de ensinar  seus filhos em casa - crianças cheias de energia, num ambiente familiar que nem de longe se parece com uma sala de aula. Isso também não é fácil. Muitas famílias não estão sabendo lidar com este momento e estão, infelizmente, apelando para o ataque e sim, muitas vezes é maldoso mesmo. Mas, sempre que possível, exima-se de responder na mesma moeda, ou encaminhe a queixa a quem de fato pode resolver o problema (financeiro da escola, orientação escolar, direção, etc). Bom, vou falar mais sobre como tenho lidado com esta questão mais à frente, em outro post. 

Entendendo a você mesmo, e às famílias, perceba que nosso papel agora é o de minimizar os danos do isolamento ao processo educativo ao máximo - mas haverão danos de qualquer forma. Portanto, não queira tirar o tempo perdido agora. Calma. Dose os conteúdos. É preciso enviar sim menos atividades. Segure a agonia de ver o livro didático atrasado. Pense sempre em atividades que possam ser feitas com o que há em casa. Atividades práticas. Menos conteúdo e mais habilidades. Pense em poucas atividades, mas que sejam eficazes. Assim você se poupa, e poupa a família. E assim, conseguirá mais adesão.

Bom, falaremos sobre diversos destes aspectos em outros posts. O que fica neste é: viva este momento da forma mais suave que conseguir. Crie uma rotina que o ajude. Seja gentil consigo mesmo. Vá com calma.

Vai dar certo.

UPDATE: consegui alfabetizar 94% da turma. Mas não fui capaz de atualizar o blog a respeito, pois o trabalho consumiu minha vida inteirinha.

Atividades Dia Nacional da Consciência Negra #Download


E então, passamos por um pequeno hiatus no blog. Meus queridos colegas de profissão entenderão: o final de ano nas escolas é um caos. E começa bem antes do final do ano em si, rs. Mas hoje achei uma brechinha para compartilhar com vocês algumas atividades que pesquisei para trabalhar com meus pequenos sobre o Dia Nacional da Consciência Negra. Na verdade estou trabalhando a questão da Diversidade durante o mês todo, mas só hoje tive tempo de upar as atividades para a pasta d 4shared. 

Garimpei algumas atividades, há bem mais disponível, vou acrescentando com o tempo, ok? Abaixo, os links para o download das atividades todas:



CONSCIÊNCIA NEGRA - ATIVIDADES

CONSCIÊNCIA NEGRA - DESENHOS PARA COLORIR

CONSCIÊNCIA NEGRA - TEXTOS DIVERSOS

CONSCIÊNCIA NEGRA - LIVRO MENINA BONITA DO LAÇO DE FITA

CONSCIÊNCIA NEGRA - LIVRO MENINAS NEGRAS

CONSCIÊNCIA NEGRA - LIVRO MINHA FAMÍLIA É COLORIDA

CONSCIÊNCIA NEGRA - LIVRO A BONEQUINHA PRETA




Beijão!

Especial Semana Farroupilha - Lendas Gaúchas - A Teiniaguá / Salamanca do Jarau

Finalizando a série de lendas gaúchas em parceria com o artista plástico Marco Baptista, hoje teremos a lenda da Teiniaguá, também conhecida como Salamanca do Jarau, personagem típica do folclore gaúcho e interpretada pela atriz Juliana Paes na minissérie "A casa das Sete Mulheres".


A Teiniaguá

Há muitos tempo atrás, quando a Espanha árabe veio ao chão, o país tornou-se um inferno. Pobreza, morte, restos de uma luta destruidora. Como àquela época era comum que fosse morta toda a "realeza" do país tomado, os poucos que restaram procuravam esconder-se da maneira que podiam. Havia entre os mouros uma princesa belíssima, conhecida por ser uma das mais belas mulheres existentes. Sua família temia que fosse capturada e morta, ou pior, que fosse dada em casamento a algum dos invasores, ou mesmo violentada. Em meio a esse desespero, encontraram uma velha senhora que dominava diversos encantamentos, e com sua mágica fez com que a bela princesa moura se transfigurasse numa velhinha, para que não viesse a ser reconhecida. Fugiram daquele inferno muitos mouros, e com eles a sua princesa transfigurada. 

Um grande grupo deles veio se estabelecer na região sul do Brasil. Logo de chegada, deram de cara com o Anhangá-Pitã, demônio dos nativos. Amedrontados, contaram-lhe a história da pobre princesa e o diabo decidiu ajudá-los. Ele então transformou a mulher em uma salamandra que tinha a cabeça como uma pedra brilhante, ou "Teiniaguá", e ela viveria numa lagoa no Cerro do Jarau. E para lá ela foi. 

Atrás da aldeia havia uma Igreja. Em um dia qualquer um sacristão, foi refrescar-se no rio. De repente a água começou a ferver e surgiu a Teiniaguá. Ele já conhecia a história e sabia que ela era uma princesa moura virgem que, se fosse conquistada, traria ao seu conquistador muita felicidade. 

Ele então colocou-a em uma guampa e levou-a até seus aposentos. Lá, ele abriu a guampa e ela se transfigurou em princesa, belíssima como era. Então ela lhe pediu vinho, e ele foi roubar do vinho do padre para lhe dar. E todas as noites acontecia o mesmo: ele abria a guampa, ela se tornava em princesa, pedia vinho, ele roubava o vinho do padre e lhe dava. Os padres, desconfiados, decidiram pegá-lo de surpresa e invadiram seu quarto, pegando-os no flagra. A princesa, assustada, tornou-se em Teiniaguá e fugiu para as barrancas do rio Uruguai. O sacristão acabou preso e sendo condenado à morte, por ter se envolvido com um ser demoníaco. 

A Teiniaguá ficou sabendo da execução e, com o coração apertado, utilizando-se de magia, foi até a aldeia e salvou seu amado. No entanto, os dois ficaram presos a um encantamento, e só poderiam ser libertos de sua prisão encantada, no cerro do Jarau, quando uma pessoa de de puro coração conseguisse cumprir todas as provas de coragem. Quando cumprisse as provas, ele teria direito a um desejo, mas precisaria desistir desse desejo para que o encantamento se quebrasse. 

Muitos tentaram cumprir as provas, mas ninguém era bom ou forte o suficiente. Duzentos anos se passaram sem que ninguém quebrasse o encanto. 

Mas certo dia, enquanto campeava o gado, um gaúcho de coração puro e valente chegou à gruta do Jarau. Ele conhecia a história do encantamento, que era contada pela sua avó charrua desde que era pequeno. Encontrou o sacristão, lhe saudou e perguntou sobre as tais provas. Tendo conhecimento delas, cumpriu-as todas. Então, foi enviado à presença da Teiniaguá, que lhe concederia um desejo. No entanto, o gaúcho nada desejava. 

Ao montar em seu cavalo, o sacristão ofereceu-lhe uma moeda de ouro como lembrança por sua passagem por ali. Ele pegou-a, pois não desejava fazer desfeita. O tempo se passou e o gaúcho sequer se lembrava mais da moeda.

Um certo dia um amigo seu anunciou que queria desfazer-se de sua boiada. O gaúcho então viu nisso a oportunidade para comprar ao menos alguns bois. Lembrou-se da moeda e decidiu trocá-la por alguns bpis. Não poderiam ser muitos, mas pelo menos garantiria alguma coisa com a moeda. Acontece que, quando foi sacar a moeda da guaiaca, não pararam mais de sair moedas e ele acabou comprando a boiada inteira!

A notícia correu e as pessoas começaram a desconfiar dele, pois era muito pobre e jamais teria condições de fazer a compra que fez. Desconfiavam todos de um pacto com o diabo e afastavam-se dele. Solitário e tristonho, o homem decidiu devolver a moeda maldita lá no Jarau, pois queria ver-se livre daquilo. 

Ao devolver a moeda, ele estava desistindo do dom que recebera, e o encantamento foi quebrado. O sacristão e a Teiniaguá foram transformados em dois belos jovens e sua prole trouxe descendência indígena-ibérica ao Rio Grande do Sul. 

Esta lenda faz parte do folclore gaúcho, reescrita por Denise Baptista. Aquarela de Marco Baptista. Esta série de posts é uma parceria entre os blogs Pensando a Educação e Marco Baptista Multimídias

Especial Semana Farroupilha - Lendas Gaúchas - A Lenda da erva-mate

Prosseguindo com a série de lendas gaúchas em parceria com o artista plástico Marco Baptista, hoje teremos a lenda da erva-mate, segundo a ótica guarani.


A Lenda da erva-mate 

Nos tempos de antigamente, houve uma grande guerra e a tribo de Itabaetê preparava-se. Então a tribo inteira entoou seus mais belos cânticos de guerra, e saiu em marcha rumo ao grande acampamento. O furor da luta lhes enchia o coração enquanto partiam em sua jornada. No entanto, havia um velho, que os anos haviam judiado e não tinha mais força para lutar por sua tribo. 

E o pobre velho ficava pelos cantos chorando, extremamente entristecido por não pode acompanhá-los em batalha. Mesmo muito tempo depois de a tribo ter partido o velho continuava parado como uma estátua, mudo, envolvido em mil recordações de guerras já idas, quando ainda tinha força e vigor e era um dos mais fortes guerreiros. Agora já velho e fraco se sentia condenado à inutilidade. 

Apenas as lembranças lhe mantinham em pé, e o amor por sua filha Yarí, a mais bela e jovem de suas filhas, que preferia ficar junto ao seu velho pai em seus últimos dias do que casar-se com algum índio. 

Um dia chegou até o rancho um viajante estranho, com roupas coloridas, e belíssimos olhos azuis. Observando o viajante, percebeu que este vinha de terras longínquas, muito além do rio. Abriu a porteira de seu rancho ao viajante, dando-lhe pousada. Yarí, hospitaleira, foi buscar os mais lindos e saborosos frutos da floresta, e o mel mais doce das abelhas da região. E o velho animava-se por ter a quem recontar suas histórias de guerras e andanças. Ele e Yarí procuraram fazer o viajante feliz enquanto estivesse em suas terras. 

A noite chegou, e prepararam uma rede para o jovem. E em seus sonhos Yarí entoava lindas canções guaranis. E quando o sol nasceu, o velho foi encontrá-lo antes que seguisse viagem. E o viajante lhe disse:

- Tua generosidade é qual as fontes de águas cristalinas... Tua hospitalidade é tal qual a planície charrua, em tua filha se esconde a pureza dos olhos d'água e a alegria das madrugadas. Tanta bondade e virtude será recompensada. Sou viajante vindo das terras de Tupá, o Deus do Bem. Peça então, meu velho, o que quiseres que te darei!

- Mas senhor, nada mereço! Mas se a bondade de Tupá me quer conceder alguma bênção, eu pediria que me desse um tanto mais de consolo em meus últimos dias. Antigamente eu costumava guiar pelos caminhos da guerra, uma incontável quantidade de guerreiros. E hoje, veja, tenho somente minha filha para me alegrar em meus últimos dias. Bem queria eu ter um último amigo fiel, para que Yarí pudesse seguir nossa tribo e encontrar algum jovem índio que mereça seu amor. Então, é isso que peço: um amigo fiel, que me acompanhe nos últimos dias. 

E o viajante, vindo de Tupá, sorriu e lhe mostrou, em suas mãos, uma planta cheia de folhagem verde e cheirosa, com um perfume que parecia ser do próprio Tupá. E então disse:

- Permita a esta planta crescer, e beba de suas folhas. A bebida que terás será o companheiro fiel que pedes. Esta erva traz consigo a graça do próprio Tupá, e se estenderá pelas matas, e confortará não somente a ti, mas a toda a tribo. E tu, Yarí, serás a protetora das florestas que surgirão de tal erva. Os guerreiros sentirão como se fosse teu próprio carinho através desta bebida, e o cansaço será mais ameno, e os dias mais felizes. 

E já indo embora, o viajante repetiu:

- Eis que terás um fiel companheiro, meu velho. E esta protegerá tua raça, Caá-Yarí.

E foi desde tal dia que Caá-Yarí se tornou a senhora dos ervais e a deusa dos ervateiros. E a bebida feita de suas folhas traz alento ao coração, e na roda de chimarrão todo cansaço se finda, dando lugar à animação da prosa entre amigos. 



Esta lenda faz parte do folclore gaúcho, reescrita por Denise Baptista. Aquarela de Marco Baptista. Esta série de posts é uma parceria entre os blogs Pensando a Educação e Marco Baptista Multimídias

Especial Semana Farroupilha - Lendas Gaúchas - O Negrinho do Pastoreio

Mais uma lenda gaúcha representada no blog, numa parceria linda com o artista plástico Marco Baptista. Hoje contaremos a lenda do Negrinho do Pastoreio.


O Negrinho do Pastoreio

Conta-se que há muito tempo atrás, na época em que as fazendas não tinham cercas e o gado e cavalos eram repontados pelos peões e cães ovelheiros coxilha afora, havia um rico fazendeiro, que tinha o melhor de tudo: a melhor fazenda, o melhor gado, os melhores cavalos e os melhores escravos. Ele tinha tanto ouro e prataria que ninguém podia contar. No entanto, era duro, sovina e mau, um homem horrível. 

Não dava pouco a ninguém, não ajudava uma viva alma que fosse, não emprestava nada, nem no inverno ela deixava que o fogo juntasse brasas. Até das sombras de suas árvores ele tinha ciúmes e ninguém podia repousar nelas. Muito menos banhar-se nas águas de seus rios!

Mas também, quando havia algum serviço na sua estância, ninguém se oferecia pra ajudar, nem mesmo pra buscar por lá algum serviço. Nem nos botecos as pessoas conversavam com ele, e não lhe convidavam pra churrasco algum, pois os poucos churrascos que ofereceu tinham uma carne muito ruim, e em pouca quantidade que mal tapou o bucho de quem aceitou o convite. E ainda ofereceu o churrasco com tanto resmungo que parecia que a carne servida era a sua própria.

Só haviam 3 criaturas no mundo para quem ele dava alguma atenção. Uma delas era seu filho, um piazito pequeno. Outro era seu cavalo baio, campeão e forte. E um escravo, de una 14 anos, muito pretinho e pequeno, a quem chamavam apenas de Negrinho. Este pobre piá não recebeu sequer um nome quando nasceu, nem tinha padrinho algum. Então, para consolar-se, o pobre guri dizia-se afilhado de Nossa Senhora. 

Toda madrugada o Negrinho acordava cedo, conduzia o baio até os campos, cevava o mate, e à tarde sofria as judiações do filho do estancieiro, que só o sabia maltratar e caçoar. 

Um dia, depois de se negar diversas vezes, o estancieiro decidiu aceitar o desafio de um vizinho seu e pôr seu baio correr contra o cavalo deste. Este, o vizinho, queria que no caso de vitória, o dinheiro apostado fosse para os pobres. O fazendeiro negou-se, queria que o campeão é que ficasse com o dinheiro! E então, combinaram a aposta: a corrida seria de 30 quadras, e a aposta, mil onças de ouro. 

No dia tratado, o lugar onde se daria a carreira juntou mais gente que quermesse de cidade grande. Havia curiosos para tudo quando era lado. E ninguém sabia direito para quem torcer, pois ambos os cavalos eram fortes, bonitos e rápidos. O baio, cavalo do estancieiro, tinha fama de correr tão rápido, mas tão rápido, que o vento lhe assoviava nas crinas e os cascos mal tocavam o chão. O mouro, cavalo do vizinho, era tão resistente que quanto mais quadras houvesse, mais ele correria. 

Fizeram as apostas. Quem iria na garupa do baio seria o Negrinho. Tendo rezado a Nossa Senhora, o pretinho aprontou-se, nervoso. Dada a largada, a correria foi uma loucura. Cada cavalo corria tanto que não se sabia quem iria ganhar. Mas a um passo a chegada, o baio escaramuçou, deu um pinote e foi o tempo necessário para o mouro ultrapassar a linha. Revoltado, o estancieiro dizia ter sido roubado. Mas não havia o que fazer e pagou a aposta. O Negrinho só sabia tremer como vara verde. 

No caminho todo de volta, o estancieiro veio calado. E o Negrinho veio rezando pela piedade de Nossa Senhora. Chegando na fazenda, a primeira coisa que o fazendeiro fez foi mandar amarrar o Negrinho pelas mãos num tronco, e dar-lhe uma surra de relho. Depois, levou-o ao campo e disse-lhe:

- 30 quadras tu perdeste na cancheira. Agora ficarás 30 dias pastoreando a minha tropilha de trinta tordilhos negros! O baio fica amarrado e tu será a estaca onde ele será preso!

E passou o dia, e veio o sol, e choveu e a noite chegou. O Negrinho, varado de fome e tremendo de medo, já se sentia sem forças para segurar o baio. Amarrou então a corda ao tornozelo, escorou-se num cupim e dormiu, rezando a Nossa Senhora. 

E a noite foi passando, e o Negrinho adormeceu profundo, sonhando com sua madrinha. E os guaxinins, malditos, roeram silenciosamente a corda que nele prendia o baio. E o baio, sentindo-se livre, galopeou coxilha afora e todos os tordilhos com ele. Acordando de susto, o Negrinho quase desmaiou quando percebeu o que acontecera. Perdera o pastoreio! Era agora que o estancieiro o mataria.

Não bastasse isso, o filho maleva do homem apareceu e viu o que ocorrera, correndo ao pai contar a desgraça. E o homem veio até o Negrinho bufando e mandou amarrar-lhe e dar-lhe outra surra de relho. Então, mandou-lhe assim mesmo, machucado e rengueando, buscar o pastoreio pelos campos. 

E o Negrinho foi até o altar de Nossa Senhora, tomou uma vela e levou-a consigo. E andou, andou, andou. E a vela benta ia pingando cera no chão. E a cada pingo, um ponto de luz nascia e logo tudo estava iluminado. Então, ele avistou o pastoreio e o trouxe de volta. 

Satisfeito o homem acalmou-se, mas não esqueceu do castigo! Pôs novamente o Negrinho no campo, servindo de de estaca para o baio. 

Porém, ao cair da noite, vendo o Negrinho dormindo um sono profundo, o filho do fazendeiro, ruim como o diabo, soltou as cordas e tocou o pastoreio. E quando o Negrinho acordou, viu o que havia acontecido, e desesperou-se. E o filho do estancieiro foi avisá-lo da nova desgraça.

E dessa vez o homem ficou bravo como o cão, e mandou amarrar o Negrinho e surrar-lhe de relho até que não gemesse mais. E surrou-lhe até que suas carnes ficassem cortadas e o sangue sujasse toda a poeira do chão. E o Negrinho chamou por Nossa Senhora, deu um suspiro profundo e parece que morreu. 

O estancieiro não queria sequer gastar uma enxada para enterrar o pobre pretinho. Soltou o corpo em cima de um formigueiro para que as formigas o comessem todo. E logo o corpo dele estava tomado dos pequenos animaizinhos que já faziam sua sina. 

E o estancieiro dormiu, e sonhou que ele era ele mesmo mil vezes, e tinha mil baios e mil negrinhos, e mil vezes mil onças de ouro. E a noite passou e houve três dias de cerração fechada. E o estancieiro sonhou o mesmo sonho por todos aqueles dias. 

Então o homem decidiu ir ao formigueiro ver o que restava do corpo do pretinho. E qual não foi sua surpresa ao ver, de pé ao lado do formigueiro, o Negrinho, são, sem uma única marca no corpo, rindo ao lado de Nossa Senhora, sacudindo as formigas que ainda o cobriam! O Negrinho em pé, ao lado do cavalo baio e de Nossa Senhora, tranquila e serena, com os pés na Terra, mas mostrando-se ainda fazer parte do Céu. 

E o homem pôs-se de joelhos, apavorado. E o Negrinho estalou o beiço e saiu tropeando o pastoreio. 

Então começaram murmúrios, de milagres novos, contados por muitos, que diziam ter visto um pastoreio de tordilhos negros cavalgando pelos campos, com um baio à sua frente montado por um pretinho em pêlo, que os levava alegremente. E muitos rezaram pela alma do Negrinho. 

E dizem que desde então, sempre que se perde alguma coisa, basta a pessoa acender uma vela a Nossa Senhora, que o Negrinho campeia e acha. Mas precisa acender uma vela pra ele. 

E dizem que todos os anos, durante três dias, o Negrinho desaparece. É que está visitando os formigueiros. E a tropilha anda solta, um tordilho aqui, outro acolá. E ao fim do terceiro dia, ouve-se um relincho de baio e a tropilha corre a ajuntar-se. É quando ocorrem as disparadas das cavalhadas assim, do nada, porque ninguém encontra motivo para tal. E o Negrinho, risonho, monta seu baio e sai em busca do que lhe pediram. 

Esta lenda faz parte do folclore gaúcho, reescrita por Denise Baptista. Aquarela de Marco Baptista. Esta série de posts é uma parceria entre os blogs Pensando a Educação e Marco Baptista Multimídias
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